Cronologia do plano golpista: o passo a passo da tentativa de golpe investigada pela PF
Troca de mensagens, áudios, registro de entradas nos prédios dos Poderes em Brasília, geolocalização de aparelhos celulares e outras provas foram reunidas pela Polícia Federal (PF) no inquérito que narra uma tentativa de golpe de Estado, que seria executada em 2022.
A trama golpista envolveria o assassinato do então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Nesta terça-feira, 19, cinco suspeitos foram presos pela PF por integrarem o grupo por trás do plano, que, pelas investigações, esteve prestes a ser executado em 15 de dezembro de 2022.
As investigações indicam, entretanto, que mais de um mês antes, um documento no Word foi criado detalhando o plano. Um dos presos nesta terça-feira, Mário Fernandes, general reformado que foi secretário-executivo da Presidência da República no governo de Jair Bolsonaro (PL) e ex-assessor do ex-ministro e deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ), é apontado como o responsável por imprimir o documento, intitulado de “Planejamento – Punhal Verde e Amarelo”, nas dependências do Palácio do Planalto.
Além de Fernandes, um policial federal e três “kids pretos”, que são militares do Comando de Operações Especiais do Exército, também foram detidos. O planejamento elaborado pelos investigados detalha os recursos humanos e bélicos que seriam necessários para colocar o plano em prática. O plano ainda envolvia a implementação de um “Gabinete Institucional de Gestão de Crise”, a ser integrado pelos próprios investigados para gerenciarem conflitos institucionais originados com o golpe, indicou a PF.
Veja o passo a passo da ação golpista:
9 de novembro de 2022
O general Mário Fernandes cria o planejamento “Punhal Verde e Amarelo” em um arquivo Word, inicialmente denominado “Fox_2017.docx”. O documento detalha um plano para sequestrar ou assassinar Moraes, Lula e Alckmin.
“Trata-se, a rigor, de um verdadeiro planejamento com características terroristas, no qual constam descritos todos os dados necessários para a executá-lo de uma operação de alto risco. O plano dispõe de riqueza de detalhes, com indicações acerca do que seria necessário para a sua execução, e, até mesmo, descrevendo a possibilidade da ocorrência de diversas mortes, inclusive de eventuais militares envolvidos”, descreve o relatório da PF.
12 de novembro de 2022
Uma reunião na residência do general e vice de chapa à Presidência com Bolsonaro em 2022, Walter Braga Netto, ocorreu no dia 12 de novembro, segundo o inquérito. Segundo a PF, a data marca o início do monitoramento de Moraes e, na ocasião, que contou com a participação do tenente-coronel Mauro Cesar Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), o major Rafael de Oliveira e o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima, o “planejamento operacional para a atuação dos ‘kids pretos’ foi apresentado e aprovado”.
Os dois são apontados como os responsáveis pelos levantamentos iniciais de “pontos de interesse” relacionados ao ministro. Os “kids pretos”, presentes na reunião, são militares de alto desempenho, treinados pelo Exército para ações de grande impacto.
21 a 24 de novembro de 2022
Entre esses quatro dias, registros de geolocalização de Oliveira e Lima, dois dos “kids pretos”, em localidades relacionadas ao ministro do STF. “A análise dos dados armazenados nos dispositivos apreendidos na fase ostensiva da presente investigação, combinada com outros elementos de prova, indica que as atividades de monitoramento do ministro Alexandre de Moraes já ocorriam no mês de novembro de 2022?, diz o relatório. Também é citado o aluguel de carros usados por Oliveira e Lucas Guerellus – alvo de busca e apreensão nesta terça-feira, 19, serviu no 1º Batalhão de Forças Especiais em 2017 –, com registros de pedágio que mostram que eles se deslocaram entre Goiânia e Brasília no período.
6 e 7 de dezembro de 2022
Mensagens trocadas entre Oliveira e Cid indicam que os dois estavam juntos no Palácio do Planalto no dia 6. Nas datas também foi registrada conversas entre o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e Marcelo Câmara, então assessor do mandatário. Neste mesmo dia e horário, Fernandes, então Secretário-executivo da Presidência, estava no Palácio do Planalto e imprimiu o planejamento operacional denominado “Punhal Verde e Amarelo”.
8 e 9 de dezembro de 2022
Nessas datas, as linhas telefônicas utilizadas no evento “Copa 2022? foram ativadas. O codinome, que também originou um grupo no aplicativo de troca de mensagens “Signal”, foi usado para se referir ao crime. Os suspeitos receberam codinomes associados a países – Alemanha, Áustria, Brasil, Argentina, Japão e Gana – para não revelarem suas verdadeiras identidades.
10 de dezembro de 2022
Marcelo Câmara, então assessor de Bolsonaro, encaminhou quatro mensagens para Cid, com informações detalhadas sobre a cerimônia de diplomação do presidente eleito, a ser realizada dia 12, incluindo a rota que seria usada por Moraes. Durante a cerimônia, os dois também trocam mensagens.
13 de dezembro de 2022
O prefixo telefônico associado ao codinome “Gana” se desloca de Goiânia para Brasília. Os registros de geolocalização mostram que ele esteve em locais relevantes para a ação que seria realizada no dia 15 de dezembro, como a residência funcional de Moraes.
15 de dezembro de 2022
Segundo o relatório, neste dia é “Áustria” quem se desloca para Brasília, também partindo de Goiânia. “Neste dia, também são observados registros de deslocamento do veículo particular de Oliveira e pelo menos um veículo oficial vinculado ao Batalhão de Ações de Comandos”, diz o relatório.
Neste dia, o plano chegou a ser iniciado, mas foi abortado. Integrantes do grupo “Copa 2022? se mobilizaram e se posicionaram em pontos estratégicos de Brasília, incluindo a região próxima à casa de Alexandre de Moraes, monitorando sua movimentação em tempo real. Cid e Câmara trocam mensagens e, no dia seguinte, Câmara avisa que Moraes viajou para São Paulo. “Por enquanto só retorna para Brasília para a posse do ladrão. Qualquer mudança que saiba lhe informo.”
O plano foi cancelado após o adiamento de uma sessão do STF que votaria o orçamento secreto. Poucos minutos após a notícia ser compartilhada no grupo em que os suspeitos planejavam o ataque, o grupo se desmobilizou e iniciou a “exfiltração”, que, segundo um jargão do Exército, é a técnica de retirar forças de modo sigiloso do território inimigo.