O livro de Elri e o golpe bem aqui pertinho, em Pombal – Por Linaldo Guedes

No momento em que artistas e militantes políticos anunciam mobilização para amanhã em todo o Brasil contra a Pec da Blindagem (mais uma aberração produzida pela Câmara dos Deputados) e anistia para aqueles que tentaram implantar novamente no país um golpe militar, é importante sempre recuperar a “memória silenciada”, a memória dos vencidos tão bem abordada em livros e filmes que documentam uma das páginas mais infelizes da história do Brasil.

            E nem precisa ir tão longe, para quem mora no sertão da Paraíba. O livro do professor e escritor Elri Bandeira de Sousa –  “A casa, o sítio, a cidade.: Pombal. crônica. memória.” – publicado no ano passado pela Arribaçã, traz um registro dessa época, em meio a crônicas e memórias sobre a cidade de origem do autor, que atua na Universidade Federal de Campina Grande, campus de Cajazeiras.

            Com o título “Noite sombria; 31 de março ou 1º de abril de 1964” o último capítulo do livro traz relatos daquele período sombrio também na cidade de Pombal. O autor contextualiza aquele período e as conseguências dele na história do Brasil de hoje. Inclusive, cita personalidades do meio artístico e intelectual que apoiaram o movimento dos militares, como o sociólogo Gilberto Freyre, a romancista Rachel de Queiroz e o jurista Miguel Reale, lembrando que o povo só voltaria às urnas para escolher um presidente em 1989, direito este que os golpistas de 8 de janeiro queriam surrupiar.

            Mas o que houve em Pombal naquela época?

            Elri Bandeira relata: “Na noite do dia 31 do mesmo mês, estudantes reúnem-se na Praça Getúlio Vargas, em Pombal, por volta das 22 ou 23 horas, quando recebem a notícia da deflagração da “revolução””. E continua: “Mas esse Golpe de 1964 não era a revolução que aqueles estudantes de Pombal almejavam. Os jovens atendiam pelos nomes de Plínio Leite Fontes, José Willame de Queiroga Gomes, Filemon Benigno, José Egesipe da Silva, Aloísio Marques, Inácio Tavares, Antônio Elias de Queiroga entre outros”.

Pombal vivia um momento de efervescência no movimento estudantil por aquele período. Alguns daqueles jovens tomam conhecimento das ideias nacionalistas de Leonel Brizola e se reuniam nos domingos à tarde na Sede Operária para articulações políticas. Pelo rádio, os estudantes também tomam conhecimento do complô das Forças Armadas.

Voltemos ao relato de Elri Bandeira de Sousa:  “Na noite do famigerado 31 de março, os estudantes de Pombal passam um telegrama em solidariedade a Jango. Reunidos na praça, ao lado da estátua de Getúlio Vargas, realizam um comício, em nome de UESI. O prefeito Dr. Avelino apoia os jovens. Discursam Geraldo Lacerda, Egesipe, José Willame. Ali também estavam Antônio Queiroga e Aloísio Marques, contrários ao golpe. Lá no Ginásio Diocesano, o padre Luís Gualberto segura os estudantes do turno noturno para não formarem no comício. Aquele comício era coisa de comunista! O delegado Mota interfere, sobe ao palanque e toma o microfone das mãos de Plínio Fontes. Depois, dá voz de prisão aos organizadores do evento, mas a prisão não se efetiva. Posteriormente, o jovem advogado e futuro jurista impetra um habeas data, com o intuito de conhecer as razões alegadas pelo delegado para aquela inoportuna voz de prisão. Nessa mesma noite, o prefeito de Sousa, Antônio Mariz, realiza comício em apoio ao governo federal, sem saber que, dias depois, seria preso. No dia seguinte, o prefeito municipal de Pombal chama os estudantes para darem continuidade ao ato na sacada da Prefeitura, que, à época, funcionava onde atualmente é o Colégio João da Mata”.

Elri arremata: “Os primeiros meses do Golpe foram de verdadeiro terror. Muitos militantes de esquerda chegaram a enterrar seus livros, para que não fossem localizados pela repressão. Foi o que fez a mãe de Egesipe: exemplares dos Cadernos do Povo Brasileiro e do jornal Novos Rumos, do PCB, foram enterrados no muro da casa de uns parentes na Rua dos Roques”.

Paremos por aqui na reprodução de trechos do livro. Entendo ser importante conhecer a história para conseguir entender essa sanha golpista incrustada em parte da sociedade brasileira. O livro de Elri Bandeira é apenas mais um retrato de quem quer vencer pela força das armas, do golpe, da ditadura, abolindo o sagrado direito ao voto, tão fundamental numa democracia plena. A obra, com quase 350 páginas, aborda muitos fatos importantes e telúricos da cidade de Pombal, em forma de crônica mesmo. Esse capítulo sobre o golpe de 1964 é leitura obrigatória para todos aqueles que sonham com um país democrático e livre de tentativas golpistas.

2 comentários em “O livro de Elri e o golpe bem aqui pertinho, em Pombal – Por Linaldo Guedes

  • 20 de setembro de 2025 a 12:10
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    Essa resenha de Linaldo Guedes vem em boa hora, num momento em que milhões de brasileiros exprimem sua insatisfação com as últimas decisões da Câmara Federal em relação à anistia aos golpistas e em relação à PEC da Blindagem. Texto certeiro e de leitura agradável.

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  • 20 de setembro de 2025 a 15:49
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    Parabéns professor Elri, um recorte da história passada que até em Pombal poucos conhecem e mostra também a importância dessa cidade, que poucos valorizam, inclusive os que nos representam politicamente.

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